domingo, 27 de outubro de 2013

orgasmo


Certos dias, como hoje, me sinto... presa em mim. Como se ouvesse uma presença estranha no meu próprio corpo, que de certa forma, me é tão familiar. Uma faceta tão interna e real de mim lutando para aflorar através da versão coreografada de todos os dias, um canto obscuro e dolorido lutando pelo direito de mostrar que existe sob a superfície polida de mim. Quando a madrugada chega, em dias como esse, o conteúdo de cada hora é tão enevoado que falar em horas deixa de ter sentido. Olho para trás e mal consigo identificar que vivi... é como assistir minha movimentação através da lente de uma câmera distante, assistir um vídeo pulando as cenas de inércia e absorvendo apenas os momentos de mudança, dissolver 24 horas de filmagens em 1 minuto de lembranças... E me pergunto: onde eu estive? E não consigo evitar essas urgências que me consomem: uma viciada em processo de recuperação, me distanciando do meu próprio corpo enquanto ele sente falta de... quê? De...  vida? emoção? sexo? erotismo? poder? De se sentir no controle de suas necessidades de extravasamento. Porque sabe... sempre fui uma artista, uma amante, uma intensa, tentando aparentar comum, tentando ser contida.  E em dias como esse, eu simplesmente, não posso. Em dias como esse eu preciso ser a gostosa que anda nua pela casa, a ninfomaníaca devoradora de pornografia que se masturba diversas vezes por tédio, a alcoólatra que bebe uma garrafa inteira sozinha e fala demais. E eu posso ser tudo isso sem ver quando a noite chega, mas a madrugada dói, sempre dói, porque é quando o julgamento do dia seguinte começa a ser gerado e surge um espelho na alma refletindo um poço profundo e nada mais... e eu só quero esquecer que ele existe. Só quero de volta a dormência nos dedos e a falta de julgamento que o álcool me deu... só quero um vestido curto, um batom vermelho, um salto alto e um colo para dançar em cima. Esquecer quem eu sou e ser um pedaço de carne sem consciência... Só quero parar de sentir a minha pele esticada de tão cheia que estou de não ser eu mesma. Só quero sentir, ter, ser feita de prazer. Só quero atingir um orgasmo dos meus sentimentos para poder relaxar. Para poder dormir.


Cristina Menezes

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