quarta-feira, 18 de maio de 2011

metáforas


Hoje é um daqueles dias sem cara, sem hora, sem rumo. Já matei meu leão. Consegui sair da cama e pôr a fuça direto no ar gelado do mundo e falar com as pessoas mesmo quando o desejo era ser invisível. Mas confesso que voltei direto para o meu mundo, na primeira oportunidade. De volta para a cama, de volta para a noite, de volta para a solidão do meu ninho... tão acolhedor quanto triste, e talvez por isso tão meu. E sei que aqui falta alguma metáfora para falar bonito. Queria poder dizer que sou como alguma planta rara, algum bixo charmoso, algum poema romântico; mas talvez eu simplesmente não seja tão exótica ou refinada assim. 'Ela é tão humana...'. É, caiu bem. Mas o foda nisso é que nem conheço outros humanos, assim como eu, para poder formar jardim, bando ou livro. Talvez eu tenha nascido com algum erro de fabricação ainda não detectado. Talvez tenha um sangue contaminado por arte, um coração maior que o normal, uma pele pequena para o próprio corpo, um cérebro que funciona nas horas erradas; ou talvez eu não seja tão exótica ou refinada para isso também. Ou, novamente talvez, eu simplesmente ainda não saiba o que fazer comigo mesma.


Cristina Menezes

quinta-feira, 12 de maio de 2011

noitadas


Dançando madrugada afora, copo sempre à mão, risos livres... quase como se a noite fosse eterna, como se a manhã já não aguardasse. O sentimento de não pensar, tão intenso como se não fosse seu o próprio corpo, sentindo-se expectadora dos próprios impulsos, dos desejos. Às vezes realmente desejaria que fosse real, que fosse sem fim, mas não. Em algum momento o corpo denuncia que existe, que já deu por hoje, que precisa ir embora. E a partir daí a coisa desanda. O vento no rosto, o calor que se apaga, o riso que morre, o silêncio de casa. Por que o silêncio de casa sempre apaga tão rápido os sons da noite? Ainda se ouve um eco fraco, quase como se o vazio de casa tapasse os ouvidos e lhe pusesse mordaça, 'quieta, deixe o ontem adormecer'. E é assim, na inquieta solidão da cama que vai se render ao tempo, fingindo, como se pudesse, que a fantasia de uma pele sobre a qual adormecer é fraca, que a noite foi boa, e que isso basta. Mas já não basta.

Cristina Menezes

domingo, 1 de maio de 2011

estupidez


Penso em você apesar de não sentir sua falta e muito menos sua presença. Penso em você porque sinto um vazio, que eu não sei do quê e nem por quê. Revelo, então, mais uma vez, minha estupidez, já que não é você quem vai me salvar e nem muito menos me catapultar pra uma dimensão mais tranquila e menos ansiosa de coisas que não têm nome.


Caio Fernando Abreu