quinta-feira, 25 de novembro de 2010

sensações


Às vezes eu penso em procurá-lo, para uma conversa singela, amenidades talvez. Tenho dúvidas quanto à minha real vontade de dizer o que senti naquela perda toda, e provavelmente ouvir em resposta apenas ataques a minha maneira de agir ou, tão somente, seu silêncio. Sinto mesmo é necessidade de um fim... algo incrível após tanto tempo dele agarrado à minha mente. Não o amo mais, como possa parecer. Cheguei a essa conclusão após realmente tempo demais, quando vi que nas minhas lembranças já não havia rosto, só físico, só mãos, e língua, e braços, e pernas. Ele agora é só mais um. Mesmo assim. Só sinto que... falta. Falta algo, não alguém, não ele. Falta eu. Falta algum pedaço de mim que ficou perdido no meio daquela dor toda. E agora é quase como se eu pudesse resgatar minha confiança entre uma xícara de café e meia dúzia de palavras e sorrisos constrangidos pela falta de assuntos findos. Quase como se eu pudesse recuperar um grande pedaço do meu amor-próprio se ao menos pudesse obtê-lo uma vez mais; me dar prazer ao lhe impingir frenéticos e incontroláveis tremores sob minhas unhas. Algo que só eu pudesse fazer. Intensidade. Aquela, que só eu sabia fazer. Sabe como é. Me invade aquela mesma sensação irracional que tivera quando o conheci, de que só ele saberia enlaçar de forma única toda a pele nua; agora também, a sensação de que não acabou, não o peito sob o meu rosto ou as mãos dançantes pelo meu cabelo, mas a sensação das coxas rijas presas às minhas, da língua esperta pela minha boca. Como antes, tento convencer minha mente de que é loucura, mas será?! O instinto animal já calou minha mente e ferveu meu sangue uma vez. E, embora insano, eu quero mais. Mais, sempre mais. É cansativo ter sonhos cheios de eletricidade todas as noites antes de dormir. Outros? Talvez. Seja porque eu gosto do difícil, ou seja lá por que, talvez eu nunca me esqueça destas sensações sem satisfazê-las. Só me falta a coragem. Para dar os passos uma única vez, para não olhar o rosto pela primeira vez, para despir uma calcinha rendada mais uma vez, para explodir no meu corpo pela liberdade de todas as vezes.


Cristina Menezes

terça-feira, 16 de novembro de 2010

metade


Que a força do medo que tenho não me impeça de ver o que anseio. Que a morte de tudo em que acredito não me tape os ouvidos e a boca. Porque metade de mim é o que eu grito, mas a outra metade é silêncio.

Que a música que ouço ao longe seja linda, ainda que tristeza. Porque metade de mim é partida, mas a outra metade é saudade.

Que essa minha vontade de ir embora se transforme na calma e na paz que eu mereço. E que essa tensão que me corrói por dentro seja um dia recompensada. Porque metade de mim é o que penso, mas a outra metade é um vulcão.

Que o medo da solidão se afaste e que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável. Porque metade de mim é abrigo, mas a outra metade é cansaço.

Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso que eu me lembro ter dado na infância. Porque metade de mim é a lembrança do que fui, a outra metade não sei.

Que a arte nos aponte uma resposta, mesmo que ela não saiba. E que ninguém a tente complicar porque é preciso simplicidade para fazê-la florescer. Porque metade de mim é platéia e a outra metade é canção.

E que a minha loucura seja perdoada. Porque metade de mim é amor, e a outra metade também.


Adaptado de Oswaldo Montenegro